quinta-feira, 18 de julho de 2013

Bolinhas Coloridas


A vida era uma aventura cheia de escolhas.
Quando pequeno, as escolhas eram mais dos pais do que dele e mais apoiadas na competição acirrada da escola, onde se aprendia que boas notas garantiriam um lugar especial em um futuro longínquo.
Ele tirava excelentes notas e amava sacudir a folha de papel, recém entregue pelas mãos do professor, onde o graúdo A pintava de vermelho as bochechas de quem tinha o vermelho carimbado na prova.
Aos dezessete anos passou no vestibular de Medicina em um dos primeiros lugares. Era residente brilhante na área de cirurgia e como microcirurgião se tornou um fenômeno nos transplantes.
Não existia quase nada que ele não alcançasse, pois o prestígio lhe permitia acesso às mais belas e virtuosas mulheres e logo construiu aquela vida que imaginava para si: tão devidamente polida que reluzia, cegando os tantos olhos que ele julgava desprovidos de brilho.
O filho de 9 anos era o seu orgulho. Excelente aluno, estudava inglês e francês, tinha aulas de tênis, natação e judô. Era cuidado pelas babás mais caras e estudava na melhor escola da cidade.
A felicidade era tão fácil, tão acessível que ele sentia uma ponta de desprezo por aqueles que haviam feito escolhas que os levavam ao caminho da mediocridade.
Um dia, procurando a chave de casa no quarto do menino, descobriu algo estranho. Embaixo da cama tinham quatro potes idênticos de vidro. Dois deles estavam cheios atá a boca de bolinhas de vidro cinza, o terceiro estava já pela metade e o quarto tinha poucas bolinhas coloridas.
Intrigado, ele saiu do quarto sem as chaves, mas repleto de curiosidade.
À noite, entrou novamente no quarto do filho, que estudava, acariciou os cabelos pretos e lisos e perguntou:
"Filho, o pai estava procurando as chaves aqui no seu quarto e achou uma coisa muito diferente embaixo da sua cama."
O menino sorriu:
"É a minha coleção de felicidade?".
"Coleção de felicidade?" - indagou o pai.
Então, o menino explicou:
"É assim: cada bolinha cinza é para aquelas horas em que a minha boca sorri, pois eu estou feliz. Como quando vejo você feliz pelas minhas boas notas, quando a professora de inglês diz que sou bom aluno, quando ganho um torneio de tênis, quando a Naná diz que sou fácil de cuidar."
"Nossa, quantos momentos felizes!" - o pai disse, orgulhoso. "E as coloridas são para os momentos tristes?".
"Não, pai! As coloridas são para quando a minha boca sorri, mas os meus olhos também. São para os momentos hiper felizes como quando nós sentamos juntos na varanda para conversar, quando a mãe tem tempo de me olhar jogando, quando a minha melhor amiga tira uma nota alta na escola, quando eu sinto o cheiro do seu perfume e sei que você finalmente chegou em casa. Quando o pote das coloridas estiver lotado eu vou dar de presente pra você! Não é legal? ".
A partir deste dia, alguns conceitos mudaram na vida do médico bem sucedido.
Ele aprendeu algumas coisas que não estão nos livros.
E o pote de bolas coloridas do filho ficou completo.
E ele prometeu à si mesmo que seriam mais numerosos do que os de felicidade.

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