Compreensão

Gosto de entender as manifestações da arte. Não experimento prazeres quando um quadro, um poema, uma crônica ou história é tecida somente com os fios das experiências, vivências e fantasias de quem a compõe e o significado escapa, arredio, de minha compreensão. Penso que um bom texto é redigido para ser compreendido e, por tal, admirado. Não contemplo com alegria um quadro que esconde significados elevados atrás de pinceladas furiosas e abstratas. Não quero precisar ouvir da crítica o que representa uma conjunção de riscos, palavras, cenas, imagens. Um bom filme, para mim, é bom por ter significado e por fazer com que eu mude, pense, reflita de alguma forma e não fique confusa tentando entender a mensagem. Não acredito que o óbvio seja chato e que apenas o complicado tenha charme. Já amo a vida sem compreendê-la e isso me basta.

Mulheres que Amam Demais

Existem mulheres que amam demais. Não simplesmente amam, mas amam esperando o mínimo em troca. Entregam sua alma e corpo e quase somente a entrega as basta, pois o amor que sentem as alimenta, supre e mantém. Elas não precisam recarregar, através de retribuições, algo que já está cheio, transbordante dentro do peito. Para essas mulheres, em um abraço bastam apenas outras mãos que as toquem suve em suas costas. Basta uma cabeça pousada em seu ombro, um sorriso vez ou outra, um miúdo ronronar no seu ouvido. Precisam de apenas um pássaro na janela para degustar a natureza. Enquanto o mundo se define pelo número de vezes em que se faz sexo, viagens, compras, conquistas, ultrapassagens, a mulher que ama demais se contenta com menos. Porque, para ela, é na contenção que se encontra a verdade.O valor está no pouco bem dado e não no muito distribuído. Conheci poucas mulheres que amam demais, pois elas são seres quase etéreos, que se escondem na alegria de suas vidas, aparecem pouco, mas iluminam como fogos de artifício a vida dos que escolhe para dividir o seu amor e energia..

Duas

Sou tão complicada. E também tão simples. O meu querer ora me surpreende por tamanha simplicidade e desliza feito cetim na história que construí para mim. Me sinto como uma nuvem a mais no céu, fluindo com brisa suave na sucessão de dias ensolarados. Porém, sou também turbilhão e construo com esmero meus próprios obstáculos. Saboto minha espontaneidade com pensamentos calculados, desvio minha paixão para atos supérfluos e adio um hoje intenso em prol de um amanhã tranquilo. Regulo meus atos, coloco números nos meus dias e planejo o que nunca nasceu para ser planejado.  Acordo com certezas e durmo em dúvidas Aí, paro e penso o porque disso tudo. Sou tão complicada. E também tão simples. Assim, a simplicidade me mantém serena e a complicação me mantém alerta para que eu, por acomodação, não deixe de estar acordada.

Perfeição

Sonhei que eu não sentia nada. Nada. Não me entristecia, nem me alegrava, não sentia dor, nem prazer, nem raiva. Apenas existia em uma ausência de sentimentos.Era fácil ligar a vida no piloto automático e sair por aí, robotizando as relações, os apertos de mão, os sorrisos, os elogios.Nada me abalava. Passei a ser alguém fácil de conviver, agradável até, pois tudo me era indiferente, liso, reto e plano. Então, na minha rigidez, eu quebrei. Olhei para os cacos da minha perfeição espalhados pelo chão e finalmente chorei. Chorei com prazer, me desmanchando em emoções. Recolhi cada pedaço e, com uma alegria profunda, levei-os ao lixo.

Hoje

Hoje eu posso sonhar. Sonhar é permitido. Quero sonhar que o amanhã será cheio de mãos dadas e que as mãos levantadas com a intenção de machucar estarão bem longe, no passado. Porque para nós é permitido, nesse apenas único dia do ano, confessar que tudo tem jeito e que podemos ter cura. Porque, sim, acreditamos, mas nos escondemos na pressa dos compromissos e não temos mais tempo de dizer que temos tempo de pensar, de refletir e de querer que o mundo seja melhor. Quero sonhar que todas as crianças estarão sorrindo, que os oceanos estarão quietos no seu sossego, que as selvas permanecerão verdes e que a vida terá o seu merecido valor. Qualquer vida. Por mais ínfima que possa parecer aos nossos olhos. Quero que o roteiro dos nossos filmes seja chato de tão alegre e bobo de tantos finais felizes. Quero acreditar que não precisamos de tantos contrastes entre o bem e o mal, entre a alegria e a tristeza, entre a dor e o êxtase. Depois de amanhã eu voltarei à mim. E continuarei pedindo a Ele as mesmas coisas.

Do meu jeito

Adoro correr. Não uso o tênis da moda para corridas, não tenho a passada bonita, não sou veloz, nem sempre me visto de acordo, não sou competitiva. Mas nesse trotinho prazeroso estou ha vinte anos, colhendo inúmeros benefícios. Acho que , na vida, tudo e um pouco assim: devemos fazer do nosso jeito, como nos serve, como nos deixa feliz, o importante é nunca deixar de fazer, mesmo que não queiramos seguir padrão algum.

Lupin

·         Eu queria ter a capacidade de resiliência dos cães, que aceitam a vida e se regeneram da dor, sem olhar para trás, sem marcas permanentes. Dedico minha admiração ao meu cão Lupin, que foi posto para morrer quando filhote por homens que não amavam a si mesmos e que, hoje, ama os seres humanos, é feliz e agradece, todos os dias, por cuidarmos dele. Simples, ele ama o ar que respira e não lembra mais do ar que lhe faltou.

Melhor idade?

·         Envelhecer é como morar em uma casa velha se desintegrando - todos os dias acordamos e vemos que algo precisa de conserto ou manutenção.

Auto estima

A idéia que temos de nós mesmos, na maioria das vezes, não corresponde ao que pensam de nós.

O silêncio que fere

  O silêncio é uma dádiva muito bem vinda em um mundo cheio de ruídos e poluição sonora. Ele restabelece a paz, recupera a concentração e revitaliza o pensamento. Porém, como tudo, ele pode ser nocivo se usado de forma errada. Ele pode ser o amigo que nos protege de nós mesmos em  momentos de raiva, frustração ou irritação, mas pode nos levar à caminhos sem volta se o deixarmos  pautar todas as nossas emoções. Dizer o que se sente, de forma delicada, revelar nossa alma e confessar nossas angústias é um ato de coragem. Não falar para não ferir protela discussões, evita confrontos, mas deixa cicatrizes de ressentimentos para o resto de nossas vidas. Seremos para sempre as vítimas de nós mesmos e, o pior, muitas vezes sem que o outro saiba. Conversar com quem amamos e aparar as arestas da convivência pode ser mal interpretado por quem escuta, mas como um remédio amargo, o momento ruim passa e vem a cura. Esperar que alguém adivinhe tudo que se esconde atrás de nosso silêncio é um ato egoísta. Deixar que nos machuquem é doloroso e dizer o que nos serve é a melhor maneira de nos amarmos e, por consequência, ao próximo.

Tempestade

       Hoje não me convide para ver o sol, pois sentirei o calor, mas não regogizarei seu brilho. Não me faça sair, pois estou escondida dentro de mim pensando minhas escolhas, remexendo minhas gavetas. Não me peça para acreditar na superação, na bondade, no fato de que tudo vai dar certo. Hoje simplesmente me deixe ser um pouco injusta, egoísta e cega para os pássaros que cantam. Me deixe chorar pelas mazelas do mundo. Só hoje. Isso me fará mais forte para o amanhã da minha vida.

Fé

Não acredito no poder do grito. Não me convece quem gesticula demais e pensa que a credibilidde anda de braços dados com as atitudes exageradas e cênicas. Confio em quem não precisa se elevar para poder ser escutado e em quem consegue silenciar com a brandura e não com a violência das palavras e dos gestos. Assim é que converso com Deus. Me assusto quando vejo as manifestções de fé através de desmaios, súplicas histéricas, berros e pulos convulsivos. Me afasto de rituais que promovem a repetição catatônica de versos, à imposição de condutas obsessivas de lavantar e sentar, a pregação humana de que merecedor de amor é quem se pune e sofre. Converso com Deus através do meu coração e de nada adianta me esconder atrás de colares de contas, pois ele sabe e conhece quem sou eu de verdade.  Não preciso de túnicas, de símbolos, de cerimonial para me sentir filha do Pai.
Deixo o palanque para os políticos, o microfone para os cantores e o teatro para os atores.

Mulher

Aceita o que meus olhos te dizem que recebo tuas mãos. Ouve a minha alma para eu poder receber o teu corpo. Tenta compreender meu choro, pois, acalentado, ele será teu sorriso. Faz-me sentir em casa que te ofereço todo o aconchego dos meus braços. Te enganas ao pensar que muito preciso. Sou mulher, sou eu quem te guardou dentro de mim e se acostumou a sentir um coração, sem necessidade de palavras.

Me ame também

Quando eu estiver com a  minha mente e o meu corpo frágeis, com meus passos trôpegos, meus cabelos ralos e o meu olhar embaçado, quero que você esteja ao meu lado. Mas que eu não seja um fardo. Que minhas atitudes não sejam reeprendidas em público, que nossa família não ouça queixas a meu respeito, que minha fragilidade não lhe imponha prisões e angústias. Se estivermos ainda de mãos dadas que seja um aperto sincero de dois que caminharam juntos e que, ao final, buscam apoio mútuo. Não me ridicularize nem me diminua perante nossos filhos, não se afaste de mim ao dormir e me dê um sorriso ao acordar, pois somos os mesmos, apenas presenciamos muitos amanheceres. Que sejamos amigos e que saibamos entender quando a condescendência cede lugar à amizade. Vou deixar coisas cairem, vou tropeçar e esquecer que um dia dancei, mas ainda serei eu.  Te peço agora, pois amanhã pode ser rápido demais.

Sexta-feira

·         Hoje é sexta-feira!  É dia de esquecer os problemas, o dinheiro, a raiva alheia. É o início do fim (de semana), com caminhadas nos parques, encontros com os amigos, aconchego na família. É hora de virar surfista, tenista, poeta, leitor, baladeiro, cozinheiro, ciclista, turista. É hora de lembrar que mesmo estando tristes ou desesperançosos o sol vai continuar a se pôr, os passarinhos vão continuar a ter o que comer e as árvores vão se manter eretas, vivendo. Porque não escolhemos o dia de nascer, mas a partir desse dia, mesmo achando que tudo depende de nós, o Maestro é Ele.
   Um brinde.

Flores na Sacada

Gosto de casa com jeito de gente, com janela florida, passarinho cantando na sacada, cachorro no pátio. Gosto de casa com design nenhum, mas com a cara de cada um que a habita. Deixo as obras de arte para os museus, pois meus olhos se alegram com a mangueira enrolada no canto, as florzinhas de supermercado replantadas na terra, as cadeiras de praia colorindo a fachada. Meu arquiteto é minha história, meus gostos divididos com quem compartilho a vida. Procuro seguir a tendência que pede música alegrando, gente se encontrando, barulho de risadas e cheiro de vida na cozinha. Minha casa não precisa ser imensa, com muitas portas e janelas fechadas. Ela precisa apenas acolher com carinho o sol, deixar a  brisa refrescar os lençóis, fechar-se para o frio e as más intenções. E acima de tudo, ela deve me fazer sorrir por me fazer pensar o quanto eu gostaria de abraçá-la.

Carrossel

  

 Me surpreende a urgência do tempo, rasgando os dias e me levando, como Carrossel, numa sucessão de chegadas.
Penso no amanhã que já foi ontem e sonho com um futuro que já amanhece hoje.
Mas me alegro e sorrio ao pensar que apesar da pressa da vida, consegui estender minha mão e acenar para quem me assiste de fora, girando. Consegui, em cada volta, desfrutar do cenário, brincar com quem está ao meu lado, também usufruindo do vento nos cabelos e da rapidez desse caleidoscópio colorido.
Consegui me segurar forte quando precisei e também fechar os olhos e respirar fundo quando minhas mãos estavam cansadas.
E quando finalmente o ritmo for diminuindo e chegar a hora de eu descer, sei que procurei fazer o máximo.
E irei embora sorrindo.