segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Sucesso


Ela era um daqueles bebês nascidos no começo da era virtual.
Onde tudo anda rápido demais, incluindo as mamadas no peito, pois como diziam, o que interessava de verdade era a qualidade do tempo despendido com os filhos e não a quantidade.
As quantidades se deixava para os congressos no exterior, a supervisão de subordinados, o aperfeiçoamento e crescimento na área.
Ela era um daqueles bebês nascidos em casa de pais casados, porém separados pela profissão, pois como diziam, o que interessava era ter a garagem para várias camionetes tão gigantes quanto um ônibus escolar.
Então, ela nasceu um pouco antes, não por gosto dela, é claro, mas a cesárea era necessária para que as férias dos pais coincidissem e ela pudesse ficar muito bem cuidada aos olhos da enfermeira que a ninava enquanto os seus pais balançavam em algum navio pelas lindas ilhas do Caribe.
Bem que se faz, diziam os amigos que já sabiam que bebês nascidos na era virtual já aprendem a pilotar um Aviãozinho Colher ao mesmo tempo que apertam teclas de seus pequenos tablets.
Mas ela tinha muito mais dentro dela do que passeios de recém nascida à restaurantes da moda e à shoppings borbulhantes de vozes.
E ela conseguia embalar com ternura a sua boneca Baby Alive no balanço da praça aonde a avó, sem a olhar, checava o seu feed de notícias no celular.
 Ela conversava com os pássaros e mostrava com ternura para a boneca as nuvens suaves e brancas que singravam o céu azul na lentidão bonita da vida.
Ela percebia que os dedos de sua pequena mão se alongavam com o passar dos meses, em meio às aulas de inglês, computação, patinação e nas seções com a fonoaudióloga.
Cresceu alegre e, para sorte dela, cheia de tudo que todos diziam ser bonito.
Escolheu um caminho com mais quantidade de coisas que todos também diziam serem inúteis e menos qualidade de outras que faziam narizes se torcerem.
E quando muitos a faziam se sentir diferente demais, quando tudo era igual à tudo, ela já adulta, vasculhava a caixa grande e quadrada guardada no fundo do armário.
Pegava a sua velha e querida Baby Alive e sabia que tinha seguido o caminho certo.
Pois a grande e linda praça, onde ela acalentava o seu bebê em um balanço tanto quanto à sua imensa solidão não estavam em uma caixa, mas para sempre dentro dela.