sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Lei


E as ovelhas começaram a uivar. Um uivo diferente, convenhamos, mas um uivo. Os lobos pararam de levantar as orelhas, pois já não ouviam os balidos que entregavam a refeição para a hora do almoço. E assim, aos poucos, elas mudaram de voz. Para os vorazes e apressados elas eram lobos vestidos em pele de ovelha. Para os sensíveis, ovelhas que no desespero de viver aprenderam  a se disfarçar. E nenhum deles tinha interesse de comê-las.

domingo, 25 de novembro de 2012

Degustação


E lhe disseram que a vida era curta.
Isso ela sabia, só não sabia porque viviam lhe dizendo isso.
Alguns diziam para poder justificar os seus erros, outros por pensarem já não ter tempo de consertá-los.
E ela pensava que quanto mais pensasse que a vida era curta, mais viveria uma vida que soava falsa, porque a gente não pode sair vivendo como se fosse o último dia.
Porque é por isso que não se sabe quando será o último suspiro, para podermos viver o que se quer viver como se fosse para sempre.
E não adianta querer sair respirando todos os ares quando se escolheu respirar do jeito que nos deixa mais cheios de vida.
Porque a vida não dá múltiplas escolhas, mas nos dá o tempo, que não é borracha, mas é diploma na arte de saber que não se pode ter tudo.
Porque só quer o Tudo aquele que só crê que a vida é curta.
Coisa que ela já sabia.
Mas o que ela sabia e não contava, é que a vida de curta não tem nada e que mais vale ter degustado cada gole, do que ir para a outra etapa embriagada.

sábado, 24 de novembro de 2012

Tempo


Então, eu fiz a minha listinha pra Deus.
Um a um dos meus pedidos me foram entregues.
No momento Dele.
Não no meu.
Porque filho não cresce se não aprende a esperar e valorizar o que pede.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Colher


O que mais vejo são pessoas chorando em frente às suas colheitas, pois por terem memória curta, esquecem que tipo de sementes plantaram.

Escolha


Não posso impedir que a maldade do mundo escape dos meus olhos e dos meus ouvidos, mas não permito que ela turve o meu coração e corrompa a minha alma. Afasto os maus pensamentos, pois não quero, com a minha tristeza, abalar a minha fé na beleza da vida.

domingo, 18 de novembro de 2012

Amanhã




E estaremos todos, em um futuro não tão distante, sentadinhos, apreciando um presente onde teremos tempo de deitar a cabeça e olhar o branco leve das nuvens.
E poderemos, sem pressa, ver o farfalhar das árvores e saberemos nomear cada espécie de pássaro que pousa em seus galhos e sorriremos com o tempo que temos para vê-las montar seus ninhos e chocar seus ovinhos.
Mesmo quando nosso passado foi cheio de pressa, tarefas inacabadas, horas mal dormidas, preocupações com dinheiro, carreira, filhos, contas, férias não tiradas.
Chegaremos lá, apesar de toda a profusão de vida qua hoje nos engolfa nessa onda gigantesca de tarefas.
Mas temos que estar com a nossa consciência doce para podermos, feito mel, deixá-la escorrer por nossas lembranças e vermos que aquilo tudo valeu a pena.
Porque toda essa correria, essa fome de vida, deve ser retrato para emoldurarmos com gosto, para podermos mostrar com orgulho, para quem quer que seja, o quanto não ficamos parados esperando os dias passarem.
E teremos muito tempo para sentar, para rebobinar nossa vida em pensamentos, para pegar o sol tão saudável da manhã e dormir todas as horas de sono que dizem corretas.
Porque acabaremos lá, nesse futuro nem tão distante, com tempo para tudo, mas sem muito tempo pela frente.
E devemos rir demais de todas essas estripulias sem motivo aparente que nós humanos fazemos, em nome de muitas coisas que esquecemos o nome, depois de algum tempo.
E sacudiremos nossas cabeças brancas, condescentedentes com os nossos erros de quem pensa que tem muitas chances, quando a única que temos é viver a nossa única vida neste mundo.
E que possamos ver que cada erro foi esboço de acerto e que mesmo errando muito, nossa alma nunca foi corrompida pelos erros permanentes, daqueles que pintam de negro o nosso caráter.
Então, estaremos prontos para seguir.
Agradecendo a Deus o tempo restante que tivemos para poder encontrar o nosso significado de existir.
 
 

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Cartilha do Amor


Porque o amor não combina com arrependimentos.
Quando acaba, deve ser guardado com perfume, feito papel de carta, daqueles que não existem mais, mas que eram guardados com carinho em pastas de plástico.
Mesmo os que tem seus pontos finais cheios de exclamações de revolta, devem ser pensados com afeto.
Porque em algum momento houve a intenção de amar o que não se ama mais e essa lacuna, hoje vazia, foi florida e cheia de expectativas e paixão.
E nos alimentou feito mãe e nos fez crescer também, mesmo que na marra, porque mãe de verdade não mima, não tapa os defeitos, ao contrário, nos mostra inteiros para podermos, mais fortes, seguirmos em frente em uma vida que é somente nossa.
Porque o amor não combina com críticas póstumas, pois estaremos matando algo que morou no nosso coração e nos fez vivos e nunca devemos menosprezar qualquer sopro de ar que nos faz ter mais vontade de viver.
Porque cada defeito e erro que enxergamos agora foi graça, diferença e espontaneidade do passado e tudo isso que tanto queremos esquecer foi o motivo de termos a coragem de dar o próximo passo.
Porque o amor não combina com arrependimentos.
Quando acaba, deve ser guardado com perfume, feito papel de carta, daqueles que não existem mais, mas que eram guardados com carinho em pastas de plástico.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Jack Sparrow


E nesse insano mundo quisera eu ter um pouco mais de loucura tatuada na alma.
Porque me encanto com a leveza de quem transita pela vida como quem não tem nada a perder.

Aqueles que conseguem entender as injustiças como pingos de chuva inesperados que se resolvem com uma corrida ao próximo abrigo, uma bolsa protegendo a cabeça ou - por que não? - cabelos molhados que estarão secos depois de apenas alguns minutos.
Quisera eu ser um pouco mais Jack Sparrow para contornar os meus obstáculos com mais ironia, mais graça, mais aceitação de que a vida nos manda um monte de coisas fantásticas ou assustadoras e que nada nos impede de sair correndo, claro, depois de dar um sorriso.
E podemos fazer nossas desgraças menos pesadas quando nos vestimos com a leveza do bom humor.
E podemos ser mais engraçados, menos encucados com a nossa lista de responsabilidades, mais originais do que o padrão que nos forçamos seguir.
Porque Jack corre engraçado, se veste mal, fala enrolado, bebe muito, não tem vergonha de ser fraco, mas se tornou muito mais querido e popular do que qualquer herói de olhos azuis e terno engomado, prevísivel e chato.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Chave


Ando por tantos caminhos.
Teço minha vida com uma infinidade de fios, vejo amanheceres que enrubescem prédios, ora oceanos, ora copas de árvores repletas de piados.
Aperto mãos frias, mãos macias, mãos que me convidam ao sorriso, ao afastamento.
Percebo tantas almas que que se lançam para fora em olhares que me fazem sentir aconchego, tristeza, medo, desprezo.
Sinto o calor que emana de corpos que apenas se deslocam de um lado para o outro no triste trafegar de vidas vazias e que se dissipam rápido ao vento dos dias.
Sinto a paixão de tantos outros que me atraem e me buscam com promessas de asas que conhecem a direção da felicidade, da leveza, da alegria, do desapego à tudo que é desnecessário.
E nessa viagem de convivências, onde me mesclo à tantos, nesta aventura da vida, sou o resultado de muitos pensares.
Guardados feito fotos em caixa de lembranças.
Mas esta caixa é única, entatalhada por mim e somente eu guardo a chave.

sábado, 10 de novembro de 2012

Felicidade


Enquanto eu tiver um jardim para ver renascer todos os dias e puder colher os seus presentes para florir a minha vida e encher de perfume a minha casa, serei feliz. Enquanto eu puder me banhar na imensidão dos oceanos que se fazem pequenos para me encontrar como ondas, serei feliz. Enquanto eu puder ver a beleza das asas que rasgam os céus e me olham de cima sem medo, serei feliz. Enquanto eu puder imaginar as mãozinhas pequeninas dos meus netos entrelaçando seus dedinhos nos meus, serei feliz. E quando eu não conseguir enxergar o quão abençoada sou por receber tudo isso, peço a Deus que desperte novamente os meus olhos para o real sentido de existir.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Egoísmo


Porque os insensíveis enxergam as mazelas do mundo como sendo problemas alheios e saem pra brindar as próprias vitórias. Vitórias essas desvinculadas do existir compartilhado, pois a linha de chegada tem o seu nome, reluzindo em letras garrafais a sua existência individual. Serão seu própro prêmio, com suas palmas solitárias a aplaudir a si mesmos.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Preço


Seja bom, mesmo que isso custe um pouco de suas lágrimas.
Mesmo que custe um pouco de sua paciência, tolerância, condescendência.
Mesmo com toda a raiva do mundo.
Com toda a pressa, a injustiça.
Porque a bondade irá abrir seu coração para a beleza que os olhos duros e sem esperança não vêem.
E com o coração aberto, você poderá finalmente conversar com Deus.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Vôo


Porque o medo impede que nossos pés tão acostumados a pisar a terra, sintam-se leves ao conquistar os céus.
Mas depois de suspensos, descobertos na imensidão das probabilidades, somos apenas vôo.

Abandono


Às vezes, nos afastamos tanto que esquecemos o caminho de volta para casa.

domingo, 4 de novembro de 2012

Que Bom Que Eu Tenho a Ti


- Por que as pessoas tem medo de falar, falar dói muito mais do que sentir dor de corpo?
- (surpresa) Não filha, falar não dói, de onde tu tirastes esta idéia?
- Minha colega sente muita tristeza, que dói nos olhos e na cabeça e nos fios de cabelo, mas ela não fala, porque tem medo.
- Medo de que?
- Acho que medo de que possa doer mais do que a dor dos olhos, da cabeça e dos fios de cabelo.
- O que ela tem medo de falar, por medo de doer?
- Hum..se eu falar vai me doer?
- (risos) claro que não!
- Bom, os pais dela foram morar cada um em uma casa diferente, mesmo eles dizendo que amam ela ainda.
- ... mas eles amam ela ainda, e muito.
- Tá, eu sei, mas ela sabe que eles não falam um monte de coisas pra ela porque eles acham que se falarem, vai doer em algum lugar dela. E ela não fala um monte de coisas pra eles porque ela acha que se falar vai doer também em algum lugar deles.
- ...
- Eu acho que se ela falasse tudo aquilo que dá tristeza nela, ela iria ficar sem dor nenhuma. E também acho que ela não iria fazer os pais doerem, porque eles enxergariam a dor dela e iriam ficar felizes por poderem dar o remédio certo. Porque o remédio não é pra barriga, nem pros cabelos. Eles são tão burros!
- Não, filha, eles não são burros, eles só não sabem tudo. Bem que eles queriam ter uma caixa mágica enorme com remédio pra dor de tudo, mas pai e mãe são apenas pessoas e as pessoas são cheias de dúvidas.
- Mas mãe!
- O que? (suspiro)
- Eu prefiro te dizer que tu é chata do que ficar pensando "chata, chata, chata", porque eu fico muito cansada de pensar e, às vezes, tu nem sabe que eu te acho chata.
- (risos)
- É mais fácil eu te dizer "chata" e tu me dizer "olha o respeito" e aí, pelo menos, tu sabe que eu te achei chata e eu sei que é falta de respeito. Porque se fica na minha cabeça e eu sei que tu não sabe que tá lá, eu fico com uma sensação estranha.
 - Isso se chama culpa.
- ...e essa sensação me dá dor na barriga e nos cabelos também e é uma dor muuuuito pior do que falar, essa dor.
- Tu me promete uma coisa?
- Humm...não é ficar uma semena sem chocolate, é?
- (gargalhada) Não! Não é isso.
- Tá.
- Tu me promete sempre falar tudo que te dá tristeza, antes de te dar dos nos cabelos?
- Tu também vai fazer isso?
- A minha dor nos cabelos demora muito mais para aparecer, por isso acho que tu já vai ser bem grande quando eu precisar te falar.
- Uau! Que legal! Mas daí tu vai me falar?
- Vou.
- Prometo!
- Diz pra tua amiga falar também.
- Mesmo que ela tenho toooodo esse medo que vá doer?
- Mesmo. Porque a dor que mora dentro de nós e a gente não deixa sair pra fora, começa a comer tudo que a gente come. E fica forte e grande que nem um monstro e pode quase nos matar.
- Noooossa...que bom que eu tenho tu mãe, pra poder falar.

Sintonia


A covivência com os animais me é fácil, fluída. Assim como a conversa silenciosa com as estrelas, as flores, o mar, cada borboleta. Com as pessoas? Bom, ainda estou aprendendo. Penso que ainda tenho mais metade da minha vida para poder compreendê-las.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Eu Te Permito


Que tu tentes me arrancar sorrisos.
Pois quanto mais eles saem, mais dentro de mim os fabrico.

O Garoto que Assobia


Ela andava cansada.
Em uma semana onde chove lá fora e dentro do peito também, ela se dirige para mais um compromisso profissional.
Os olhos embassados, feito o vidro do carro, procuram os números quase invisíveis no manto denso da neblina.
Estaciona.
Senta na primeira mesa, de frente para a entrada.
A cafeteria cheira à torradas, flores e doces, e as luzes são amareladas. Faz frio.
O café é excelente, o atendimento também. Sorve o primeiro gole e parece se sentir bem. 
Está dedilhando o celular quando ele entra.
O garoto.
Ele vem assobiando alto, derretendo o frio de lá de dentro. Sem vergonha e sem receio de parecer inconviniente, como tantos de sua idade.
Estranho, engraçado, bonito isso.
O celular descansa na mesa e os olhos dela agora estão presos na boquinha que solta aquele assobio tão alegre que enche a pequena sala.
Meninos nesta idade são barulhentos, alegres, mas quando estão em turma.
O garoto avista outro garoto que está sentado perto dela.
Como não o vi?
Vai em sua direção com um sorriso aberto e senta ao seu lado. Liga o Laptop do outro, que estava desligado, e caem na risada. Começam a conversar e brincar na tela plana e colorida.
São parecidos. Irmãos? Mas irmãos riem tanto quando estão juntos?
Os olhos dela agora se dirigem à figura alta de um homem que entra na cafeteria.
Os garotos dão um pulo ao avistarem o jovem adulto que segue até eles e os envolve em abraços e beijos.
O pai.
Os três conversam e zumbem como abelhinhas em flores e as imensas mãos não se cansam de acariciar as cabeças agitadas por tantas falas.
Existem respostas prontas e entusiasmadas à cada pergunta feita.
Ela quase enxerga a cumplicidade pairando como fada, enquanto a conversa corre solta.
Ela se esquece das nuvens carregadas lá fora e das botas enlameadas. Se esquece do que veio fazer ali e do porquê de tantas noites mal dormidas.
Se esquece da polpuda conta no banco e, por um lapso, da carreira que escolheu seguir.
Ela sabe que os dois garotos tem pela frente um futuro. Todos tem.
Mas o amanhã de cada um será cheio de assobios. Mesmo em dias nublados.

Pois só assobia na chuva quem, um dia, conheceu o  amor de verdade.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Cada Um


Tantos passam e não tenho tempo de retê-los.
Mas gostaria de ter dimensões paralelas para poder sentar com cada alma e escutar  o que me diz o seu silêncio, mais do que a sucessão de palavras vazias.
Quisera eu ter a coragem de me aprofundar em vidas que me são apenas bom-dia e poder com elas alimentar a minha existência de vivências.
E eu poderia ser ponte para ajudar na travessia de rios revoltos que para mim são córregos translúcidos e calmos.
E elas poderiam ser respostas simples à problemas que considero insolúveis.
E poderíamos ser juntos o tudo que tanto falta.
Mas que é tão raro, tão difícil de alcançá-lo, transpô-lo, expugná-lo.
E nós todos somos tão a mesma coisa.
Perdidos em diversas interpretações.
Repartidos em tantas entonações.
Elos quebrados, inteiros, rachados, fortes, fracos, podres, danificados, intactos.
Apenas vivendo na ingênua crença de que sozinhos seremos corrente.



Verdade


Se eu perder, nunca perderei tudo.
Se eu chorar, me angustiar, sofrer.
Posso ainda sorrir, me alegrar, ser feliz.
Por mais que doa, tudo tem cura.
Nesse caleidoscópio que é a vida.
Por isso, enquanto respiro não me permito morrer nas vivências, mesmo elas sendo as mais sofridas.
Pois não preciso antecipar a única verdade que sei me esperar no fim dos meus dias.