sábado, 28 de abril de 2012

Azeitonas Pretas com Marshmallows

Quem sou eu neste mundo cheio de gente que faz? Vivo me posicionando a favor ou contra,emitindo opiniões, criticando, bradando que as coisas não podem ser assim ou assado. Mas não tenho voz. Sou um numerozinho ínfimo, uma cabecinha em uma multidão, alguém que curte que curtam no Facebook suas teorias sobre a vida, suas críticas, seus devaneios. Esse é o máximo de popularidade que me permito. Fora isso,bom, cuido do meu jardim, tento salvar um cão ou outro da vida injusta, lambo muito minhas crias, varro meu pátio, reciclo meu lixo. Procuro ser gentil no trânsito, agradecer as gentilezas. Mas sou apenas alguém comum, alguém que não faz diferença  se escolher vestir somente amarelo ou gostar de azeitonas pretas com marshmallows. Sorte de quem pode através de sua música, poesia, livro, poses para fotografia, interpretação, posição política, cargo, profissão, fazer diferença com sua voz. Voz que é ouvida por muitos, por vários. Voz que faz diferença e que acorda, pois põe um monte de gente pra pensar. Pena que as verdadeiras vozes andam sumidas e as que aparecem, quando falam, pronunciam discursos banais a seu próprio favor. Ou são vozes vendidas que esquecerem tanto os outros que acreditam serem redentoras de si mesmas. E, para pessoas como eu, sobra a escrita solitária, a música, a pintura sem grife, a foto sem nome e o refúgio de acreditar que, mesmo pequena, a menor vibração pode se tornar uma grande onda no mar.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Mar de Sereias

De vez em quando minha alma fica indócil. O corpo está bem, com saúde, a vida acontece sem maiores percalços, o sol está lá fora. Mas ela fica me dando sinais de sua inquietude nos momentos mais banais, na fila do banco, na direção do carro, no silêncio da casa. Ela me pede algo que não sei o que é, mas sei que ela está de joelhos e não consigo entender. Como vou entender se apenas o que ouço ela dizer é que tem vontade de planar serena por entre um céu estrelado para esquecer um pouquinho desse corpo que a carrega? A rotina fica mais difícil e qualquer atividade do dia a dia fica mais demorada, pois alma inquieta pesa mais. Converso com ela e conto que hoje vi uma conhecida de lenço na cabeça raspada, por causa da quimioterapia e que, isso sim, é para se desesperar. Mas alma não racionaliza, sente. Alma não é como corpo e mente. Alma voa nos sonhos para lugares desconhecidos, conhece pessoas de outro mundo, mergulha em mares com sereias, olha cidades inteiras através das nuvens. Alma sente desconforto e chora, mesmo com o corpo sorrindo. Ela não aparece, mas espia um poquinho pra fora, através do olhar. A sede dela não é de água e, por engano, a gente envenena o corpo para tentar matar uma fome que não compreende. Por isso é tão difícil entender nossa alma, ainda mais quando ela fica assim, indócil. Para entendê-la temos que, às vezes, fazer coisas difíceis de se fazer. Temos que ouvir, sem existir som, enxergar sem ver uma imagem, alimentar sem alimento, acariciar sem ter contato. E quando nada disso dá certo, eu fecho os olhos e ponho meu corpo para dormir para minha alma poder acordar.

sábado, 21 de abril de 2012

Keep Walking

Vivo me preparando para situações que acabam não acontecendo. Me preparo para ser feliz e acabo ficando triste. Imagino que vou me entristecer, e muito, quando, na verdade, me sinto satisfeita por ter crescido. Imagino cenas que, realizadas, são muito distantes das que idealizei. Aprendo tanto, todos os dias, com essa vida que me surpreende e me mostra que não sou eu que controlo tudo. Até virei mestre em aceitar. Às vezes o aprendizado se faz em pouco tempo, muitas vezes demora meses ou anos para a mensagem ser entendida. Aquela de que depois de uma tempestade o céu pode ficar azul bem rápido e de que um horizonte límpido pode se turvar ao peso de nuvens densas e escuras. Nada é definitivo, só a morte. E temos que lidar com isso. O trabalho está às mil maravilhas e, de repente, somos demitidos. O namoro vai bem, mas ele nos vem com a notícia de que vai viajar por dois anos para o exterior. A gente colhe o que planta, mas uma boa geada pode mudar um pouco o resultado da colheita. Sou mestre em ficar feliz e acreditar que sou feliz para sempre, em ficar triste e crer que já nasci tristonha. Sou do tipo que acredita em amor eterno, em honestidade acima de qualquer preço, em bondade, em esperança. Também acredito que o ser humano é mal, que a vida é injusta, que o amor é relativo. Aí vem a vida é me mostra tudo ao contrário. Pego as minhas regras e as engulo. Calço meus sapatos e sigo caminhando.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Vida

Gosto muito dos barulhos sutis dos vizinhos que me cercam. Não me refiro aos sons estridentes, marteladas ou gritos, mas aos passos abafados pelas paredes, janelas sendo abertas, nomes sendo chamados, panelas e suas tampas. Gosto também dos cheiros de comida sendo feita, talheres retinindo, risadas. Um chuveiro ligado com uma criança no banho, cantando. Gosto também de sair à pé, à noite, admirando as ilusões de cada um escritas em forma de jardim, de luzinhas que iluminam o caminho de pedras, de enfeites postos nas paredes, de cata ventos coloridos, telhados recém pintados. Luzes azuladas de tevês que revelam o descanso merecido, gente em volta das mesas, pés em cima de almofadas, cães de lencinhos coloridos deitados ao pé da escada. Tudo anda tão estranho, as pessoas tão distantes, cavando seus espaços, excluindo a convivência do seu dia a dia, que esses sons e imagens do cotidiano de alguém me fazem lembrar que estamos todos juntos nesse barco que se chama vida.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Unidunitê

Mas que coisa! Os acontecimentos que tanto esperamos nunca acontecem quando esperamos e sabe-se lá porque. Queremos muito um namorado, uma festa, ser reconhecido, um emprego, um trabalho. Ficamos dias sentados, curtindo o desfortúnio dos Não Acontecimentos, a beira de um ataque de nervos, perto da caixa de entrada dos e mails, esperando aquilo que sabemos merecer e nada acontece. É a lei do "Não Espere que Você Alcança" e será quando você menos esperar mesmo, que tudo irá acontecer. E, de preferência, em dobro, triplo. Penso que seja uma espécie de lição: fique contente com o que você tem - que é bastante e você sabe - curta cada pedacinho da sua vida que a recompensa será aquele bônus extra, porque é a saúde o que interessa e o resto não tem pressa. Puxa, mas estamos em dia com o check up e, de repente, não é só isso que queremos da vida. A gente também vive de satisfação mundana , pois vivemos no mundo e aqui é bom ter namorado, festa, trabalho e não só saúde.Talvez seja o castigo pelo grande Pecado Capital disponibilizarmos do corpo são, mas não termos um belo trabalho, nenhum relacionamento amoroso, nenhuma festa e não sermos valorizados pelo que gostaríamos de ser. Porém quando, mesmo com a saúde cem por cento, acontecem essas coisas boas, elas vem todas de uma vez. Não o trabalho junto com a festa e o namorado, mas três grandes propostas de emprego, duas ótimas festas e alguns caras interessantes, que estavam escondidos sei lá onde, resolvem te telefonar. É a hora do "unidunitê" e lamba os dedos, pois só daqui a algum tempo suas outras oportunidades irão aparecer. E de preferência, quando você menos esperar e todas de uma vez.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Humanidade

Um psicólogo americano, autor de 12 livros, revelou, em entrevista, que a humanidade está no seu momento mais pacífico de todos os tempos. Se retrocedermos na história da civilização, nossos dias são os de maiores lacunas entre um episódio de extrema violência coletiva e outro. Ele afirma que o ser humano é violento e mal por natureza e basta observarmos uma criança até os seus dois anos de idade para comprovarmos. Ela só não mata porque não disponibilizamos à ela uma faca ou revólver e ainda, tentamos controlar os seus ímpetos primais através da educação. Assim, somos violentos e maus e pronto. O que nos suavizam os instintos é o nosso grau de civilidade. Penso que essas lacunas de pacificidade são as mesmas que experimentamos em relação à felicidade. Nascemos infelizes, já inadequados ao mundo, com dificuldades natas de respirar, enxergar, se alimentar, sobreviver. A situação ideal útero, mãe e satisfação de nossas necessidades básicas irão nos perseguir pelo resto de nossas vidas e teremos que nos adequar, da forma mais saudável possível, na tentativa de resgatar a segurança visceral que jamais voltará. Por isso, como a violência, a infelicidade nos dá tréguas através de lacunas que nós mesmos criamos. Na verdade, penso ser mais adequada a palavra "não-feliz", se essa existisse. Somos "não-felizes" de segunda a quinta, no horário de trabalho (com felizes exceções), quando acordamos se despertados (e não naturalmente), na dieta, no exercício forçado, no cumprimento de regras sociais, nas limitações  em geral. Preenchemos e criamos nossas lacunas de felicidade tendo a capacidade de enxergar o tudo de bom que a vida pode nos oferecer. Quanto mais lacunas tivermos no nosso dia a dia "não-feliz", mais felizes seremos. Sermos violentos, maus e infelizes é um conceito pessimista, mas até o pessimismo tem lá suas lacunas de otimismo. Porque se fôssemos a espécie ideal, jamais estaríamos destruindo o mundo e o mundo não seria o que é, pois teríamos o direito ao Paraíso.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Te peço que ainda dê tempo

Às vezes quero tanto alcançar sonhos um pouco distantes, mas não impossíveis e tantas outras vezes descanso no sossego da minha acomodação. Me vejo em papéis que imaginei feitos para mim, mas por medos abstratos, deixei-os sumir como estrelas cadentes que brilham somente na surpresa do momento. Mergulhei em um oceano de escolhas boas, eu sei, grandes e importantes, mas que poderiam vir acompanhadas de outras, que  naquele passado da minha vida não se pareciam com um futuro. Porém, o futuro chega rápido e, como árvore de Natal, vem carregado de bolinhas que foram guardadas e esquecidas, para serem lembradas depois. Esperei tão pouco de mim mesma e me julguei tão pouco merecedora que, hoje, com a sabedoria dos anos vividos, ainda me pergunto se tenho tempo de fazer mais. Porque finalmente amo tudo que passei, fui, atravessei, pois me tornou o que sou. E não me vejo mais pouco nem muito, mas na medida exata para me respeitar. Ainda preciso de projetos que me mantenham caminhando e, mais do que nunca, eles devem ser parte do momento em que finalmente aprendi a me amar.

Dois Mundos

Cometemos vários erros ao nos tornarmos pais, mas considero dois deles os principais: esperar que nossos filhos sejam iguais à nós e que sejam iguais entre si, se tivermos mais de um. Sou mãe do sol e da lua, da explosão e do silêncio, da euforia e da contenção. Vivo em um delicioso mar de palavras, de histórias contadas em meio à gestos, mas também sou parte do sossego, da vida levada mansa e discreta atrás de uma porta que esconde vidrinhos coloridos de perfume, livros diversos, sapatos organizados por estilo, vestidos com estampas de bichos. Sou deliciosamente invadida por abraços e beijos inesperados, apertos de bochechas como se fosse eu criança, carinho explícito, escrachado. Mas sei também entender o amor escondido na brincadeira discreta, no convite para o cinema, para dividir a opinião de um vídeo. Tenho o privilégio de transitar por dois mundos, cada qual com sua beleza, dificuldades, nuances. Sou a observadora voraz de seres humanos que se encaixam na vida, fazendo dela o lugar mais habitável possível, dentro de cada expectativa, sonho, ilusão. Dentro de cada reação que virou jeito, depois de ter sido experiência antiga. Aprendi a ser duas mulheres, a ser duas felicidades, dois corações que não esperam recompensas, nem retorno, tampouco garantias de receber o que dou. A única coisa que espero é que esses dois univesos, que em mim já habitaram, sejam plenos e felizes, mesmo que, um dia, eu seja apenas a estrela distante que brilha longe em cada um dos seus céus.